Memórias de meio século

Este foi o discurso para os meus amigos e família no aniversário dos meus 50 anos:



A teimosia do tempo encarcerou-me numa viagem de sentido único. Desabrochar no cair das folhas é como uma reafirmação que o ciclo da vida é contraditório pois quando a natureza de despe de folhas engalana-se de pujança para a vida. Cinquenta ciclos cumpridos repletos dos resíduos dos sonhos por cumprir de coisas por fazer e palavras por dizer. Meio século permite a reflexão encetada na rudeza agreste duma aldeia da beira alta. Em tempos sombrios da existência de um pais descorado de oportunidades e sangrado das suas gentes. Calcorreavam-se caminhos tortuosos ao encontro da cartilha alumiada por uma candeia na cópia dos trabalhos de casa.
Na lotaria do destino foi possível encurtar a distância dessa cartilha e perceber que o coração pode elevar ao infinito a distância e reduzi-la na razão inversa da ilusão da velocidade do tempo e tudo se pode concentrar numa lágrima saudade de um afago maternal. Mudado o cenário acarinhado em mimos de nobreza e gestos amistosos e altruístas a vida continuou. Vi o meu país despertar e acreditei que se pode reiniciar com uma pausa. Numa madrugada de primavera senti a força da liberdade na ruptura das amarras e na euforia do sonho renascido das oportunidades. Renasci e acreditei, nesta euforia de futuro aprendi amar o país embalado num mar de cravos. 50 Anos encetados a meio do século que a História diz dar voz ao povo mesmo com dois genocídios e em conmtrapartida uma ascensão tecnologia exponencial numa velocidade ilusória de movimento perpetuo. Senti os dilacerantes atropelos nos sentimentos inerentes a perda de gente que ao partirei levam parte de nós, como ficássemos incompletos, Mesmo abandonando uma carreira por necessidade e não por opção podemos sublimar a compensação sabendo e desempenhando a nível dos pares.
Aprendi que as paixões alimentam a existência mas há sempre uma que nos dá a essência do despertar e com ela foi possível renascer três vezes, projectando com eles os olhos no futuro. Descobri que ensinar educando pode ser a melhor forma de saber e enlearmo-nos com a vida numa tarefa permanente e inacabada mas sempre o nosso melhor trunfo. No fundo indexação a vitalidade essencial para ter forças suficientes com a inclusão dos seus sonhos nos nossos. Meio século é mais do que memória é também aprendizagem interactiva inacabada e o desassossego de sentimentos, ou seja, a vivência da existência e as suas lições de vida. Conheci gente dos mais diferentes extractos sociais económicos, aprendi com todos eles, porém nem sempre fui intelectualmente exímio para superar e /ou discípulo os melhores, mas desse convívio enriqueceu o meu discernimento em lidar e compreender o mundo. Compreendi que o mundo é gerido por um conjunto limitado e circunscrito cujos focos de decisão assentam no poder económico ou caciquismo e imbuídos em engrenagens oleadas de corrupção e parcas de universalidade de oportunidades. Alguns imbuídos nessa máquina na esperança e crença de dela fazerem parte, vendem-se na sua integridade a troco das migalhas excedentes que alcançam enclausurando-se num mundo de trocas ilusórias, e vivem como fractais nesse autismo de vida.
Aprendi que nesse canto de sereia alucinógenia de mentes entorpecidas pelo brilho da matéria acabam cegos pela ambição que transforma a sua vida numa exposição exponencial de visibilidade, irradiante tão reactiva destruidora na sua essência dos núcleos básicos de existência como a sua génesis ou as suas origens, o seu fulcral DNA. Vi alguns que numa espiral de glória se encontram perdidos ante a solidão, outros tão enclausurados na sua mesquinhez que pagam para sentir o ar que respiram, e saberem olhar para a natureza que os circunda, entendi que a existência do Homem é uma civilização com erros permanentes na sua história sempre detectados, identificados, estudados e exaustivamente criticados, mas fatalmente repetidos cuja variável constante é o tempo, e cujas correcções são deficitárias numa amnésia colectiva que se perpétua. Gente que a racionalidade não tem sentido sem sentimentos pois a vida na nossa animalidade social só faz sentido com espírito de grupo e os laços de ternura que servem de elo entre cada um dos seus constituintes. São esses momentos que preenchem o viver.
Aprendi a acreditar que mais do que uma entidade divina a amizade tem uma candura e um âmago conciliador, não deve ser traída e deve assentar na capacidade de comunicarmos que é a melhor forma de nos afirmamos como Homens. Procurar as palavras certas para criar uma relação pode ser tão difícil como dizer as palavras adequadas e atempadas para a mantermos, mas na malícia da evolução a comunicação pode-se transformar no ilusionismo das ideias na manipulação das mentes imperando o dogmatismo, a demagogia o idolatrismo e consequentemente o manuseamento catalisando para uma pseudo inovação criativa e laboratorialmente arquitectada, acabando por ruir os escombros a fim de haver espaço a uma nova. Encadeados nesta cadeia de correntes e modas sobrevive uma maioria acorrentada sem modo de pensamento e criação autónoma. 50 Anos são muito mais vida que isso, porque em 50 anos há muitas palavras silêncios, ideias, pensamentos, gestos, ou acções puídas pelo tempo, e intempéries do destino acabando por ser desvirtualizados porém não deixam de ser genuínos, apenas perdem o sentido da repetição ou na cadência da rotina.
Meio século é pois um caminho longo mas suficientemente curto para aprender mas suficiente para ensinar a amar e saber que a vida não se limita às pessoas mas também ao ambiente que nos circunda. É reconfortante amarmos as pessoas que outros trouxeram para a nossa vida. Encontrei na minha relação com os animais autênticas lições de vida que na sua irracionalidade me induziram em pensamentos profundos. Eles cumprem o desígnio mais básico e essencial da vida que é viver, algo que muitos humanos perderam transformando-se em autênticas feras a competir em digladiações de guerras de gabinetes ou hipocrisias de sobrevivência sem precedentes e sempre sedentos de sangue, numa maledicência e maleficência catatónica e cíclica.
50 Anos são também o caminho para perceber que mais importante do que vivemos é o que temos para viver tendo como lei essencial a fidelidade a princípios, a amigos e paixões. E a capacidade de sorrirmos à vida. Continuar a acreditar que tudo pode estar gasto e nós enferrujados no tempo mas temos de apostar em nós próprios nessa forma de vida em cada minuto que passa tal como nestes últimos 5.256.000 minutos e aí podemos continuar a sonhar porque é o sonho que comanda vida assim como todos aqueles que na proximidade são partes integrantes e essenciais, verdadeiras enzimas catalisadoras da nossa existência as quais devo o meu sincero agradecimento.
Obrigado
António Veiga


1 comentários:

ern@zone disse...

Uns dias tarde, porem um parabéns sincero.
Que a vida continua e que o sonho fica nela.
Abraço

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