Tratar da saúde

Cada vez mais as pessoas vivem como se nunca fossem morrer e morrem como se nunca tivessem vivido. Projetam-se de tal forma no futuro que não vivem, nem no presente nem no futuro. A morte é evitada como tema de conversa e reflexão essencialmente numa sociedade que celebra a juventude, a beleza, o individualismo, o materialismo e que prefere ignorar, tratar com indiferença ou desprezar experiências humanas como a deficiência, a doença, a velhice a dependência e a morte. Aliada a esta sonegação social o empobrecimento da morte como experiência humana é também consequência do desenvolvimento da medicina e das suas diversas especializações que tendem a coisificar o corpo e a reduzir a pessoa doente a um aparelho que não funciona. Fugimos dessa realidade, mas ela existe. Somos confrontados com a realidade que Portugal tem elevado a taxa de mortalidade substancialmente- Há vários fatores a ponderar, a população envelhecida, a resposta inadequada do serviço de saúde com a sua suborçamentação crónica, a pandemia, a diminuição das condições socio económicas entre outras. É um cenário que carece uma reflexão aprofundada e uma acção corajosa e pertinente. Mas o sistema manter-se-á assim quase até à rutura e existe por opção política, má gestão e múltiplos interesses instalados. A mentalidade de gestão dos serviços de saúde nas últimas décadas foi roubada das empresas privadas. Esse paradigma errado só nos trouxe mais despesa e desorganização. Os governos acharam que se dessem menos orçamento aos serviços de saúde, estes iriam gastar menos no ano seguinte. Olhavam para a suborçamentação como uma forma de controlar os custos dos serviços de saúde, mas basta olhar para a evolução da despesa do SNS nos últimos para ver que estavam enganados. Foi uma estratégia errada porque causaram sofrimento aos serviços de saúde, provocando uma hemorragia de recursos do SNS, sem sequer atingirem o seu objetivo principal que era controlar os custos. Saúde e inteligência são as duas bênçãos desta vida, mas ambas requerem ser cuidadas e não se verifica isso presentemente.
O serviço público deixa de investir em quadros para investir em tarefeiros criando diferenças significativas no que auferem e pondo os serviços sem um planeamento adequado para a população e os meios que têm como alvo. Os profissionais de saúde suportam a falta de carreiras e incentivos profissionais oscilando no pluriemprego entre a pública e a privada descapitalizando o SNS e alimentando o sector privado, algumas das vezes cooperando em sistemas provavelmente potenciadores de corrupção que vai minando o sistema para um beco sem saída. A população ou fica sem cuidados de saúde atempados ou recorre a sistemas de saúde que na forma como estão implantados não são sistemas de saúde alternativos porque em caso sério de doença não dão resposta. Outros, com subsistemas de saúde como a ADSE vão contornando essas falhas, provando que só existem porque o SNS está a funcionar mal. Se nós tivéssemos um SNS que fosse capaz de providenciar cuidados a todas as pessoas que deles necessitam não precisaríamos da ADSE. Nós precisamos da ADSE porque construímos um SNS em muito pouco tempo e não foi possível criar todos os recursos necessários. A ADSE é prévia ao SNS e por isso é que se manteve. A ADSE não é um seguro privado. As pessoas que têm este subsistema de saúde pagam uma percentagem do seu ordenado, o que significa que as pessoas que ganham mais pagam mais e quem ganha menos paga menos. Isso não acontece com um seguro de saúde privado. Os cuidados oferecidos pela ADSE são sempre os mesmos, independentemente daquilo que uma pessoa paga todos os meses. O desconhecimento da população pela onerosidade dos serviços de saúde e falta de educação para a saúde contribui para o descalabro que é o acesso aos cuidados. Gerir um privado e um público não são atividades comparáveis em Portugal. Achar que a gestão privada pode ser mais eficiente é uma ideia falsa baseada em análises comparativas entre serviços que não são comparáveis. No entanto, eu acho que no que toca à gestão de dinheiros, não há diferença nenhuma entre privados e públicos, ou seja, existem exemplos de gestão privada e pública que são desastrosas. Mas no caso da saúde, a avaliação da eficácia não pode ser só pela gestão, tem de se basear em indicadores de saúde. Quando nós vamos avaliar os indicadores de saúde, vemos que os países com serviços públicos com acesso universal tendencialmente gratuito são sempre superiores aos países que assentam em serviços privados. Não há nenhum estudo que nos comprove que na área da saúde a gestão privada seja superior. Gerir um hospital privado é totalmente diferente de gerir um hospital público. Isso começa logo pelos serviços que o hospital privado oferece. Os hospitais privados praticamente não oferecem serviços para cuidados agudos, de AVC, de enfartes ou unidades de cuidados intensivos. Os hospitais públicos são obrigados a assegurar essas respostas que são das mais caras que existem. Em saúde não se pode simplesmente aceitar o axioma da liberdade plena do mercado, uma vez que, entre outras coisas, o produto final é a vida.
Quantas mudanças se poderiam fazer investindo nas carreiras com exclusividade e incentivos, que não uma redução de listas de cirurgia que são formas pouco ortodoxas de resolver o problema e ficam talvez mais dispendiosas para o estado É preciso investir a sério na prevenção e promoção da saúde. Só quando tivermos unidades de saúde familiar, médicos de família e cuidados continuados e de reabilitação para toda a população, assim como unidades de continuados diligentemente funcionais, é que teremos hospitais que não estão sobrelotados. Não há soluções fáceis, mas alguns dos caminhos seriam vontade política descomprometida de interesses e com um planeamento adequado à nossa realidade e não apenas gestões amorfas e cinzentas que no final são de conta corrente sem respostas quando se conseguir talvez haja mais saúde em Portugal ou talvez fiquemos eternamente numa espera azeda duma utopia. Pensem nisso António Veiga
 
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